O LOGRADOURO
Logradouro é o pátio ou jardim, quintal, terreiro, lugar de recreio, terreno de horta, com árvores e mais terrenos [contíguos a um edifício] que estejam na dependência e ao serviço de um prédio urbano (seja este habitacional ou afecto a outra finalidade).
Entende-se por prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro. (cfr. artigo 204.º, n.º 2, in fine, do Código Civil).
Em minha opinião, o logradouro, terreno não edificado que circunda o prédio, é um espaço imperativamente comum, que cabe na previsão do disposto no artigo 1421.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil.
A assembleia de condóminos não pode deliberar, mesmo que por unanimidade, contrariando normas legais de natureza imperativa.
Porém, o LOGRADOURO só será imperativamente comum se outra qualificação não resultar do título constitutivo da propriedade horizontal.
Só as partes presuntivamente comuns do edifício (cfr. art.º 1421.º, n.º 2, do Código Civil) podem ser divididas e/ou atribuídas em domínio exclusivo a um, ou em compropriedade a apenas alguns dos condóminos, mediante eventual modificação do título constitutivo da propriedade horizontal.
Trata-se duma divisão "amigável", consensual, decidida por unanimidade dos condóminos, extrajudicialmente, feita nos termos do artigo 1419.º do Código Civil.
É que, não podemos esquecer, o estatuto de um condomínio é definido pela LEI e pelo respectivo TÍTULO CONSTITUTIVO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL!
Código Civil
Artigo 1421.º
(Partes comuns do prédio)
1. São comuns as seguintes partes do edifício:
a) O solo, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio;
No mesmo sentido parece estar o artigo 76.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU).
Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU)
Título III Condições especiais relativas à salubridade das edificações e dos terrenos de construção
Capítulo III Disposições interiores das edificações e espaços livres
Artigo 76.º
Nos logradouros e outros espaços livres deverá haver no longo da construção uma faixa de, pelo menos, 1 metro de largura, revestida de material impermeável ou outra disposição igualmente eficiente para proteger as paredes contra infiltrações. A área restante deverá ser ajardinada ou ter outro arranjo condigno.
Os pavimentos dos pátios e as faixas impermeáveis dos espaços livres deverão ser construídos com inclinações que assegurem rápido e completo escoamento das águas pluviais ou de lavagem, para uma, abertura com raio e vedação hidráulica que poderá ser ligada ao esgoto do prédio.
Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE)
Os espaços verdes e de utilização colectiva, infra-estruturas viárias e equipamentos de natureza privada constituem partes comuns dos lotes resultantes da operação de loteamento e dos edifícios que neles venham a ser construídos e regem-se pelo disposto nos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil. (cfr. artigo 43.º, n.º 4, do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE)).
Também poderemos equacionar, algo falaciosamente, considerar o logradouro parte não comum. (Não é este o meu entendimento!).
Considerar o logradouro parte presumidamente comum (cfr. art.º 1421.º, n.º 2, alínea a), do Código Civil) e tentar afastar a presunção de comunhão.
Ou seja, tentar afastar a hipotética presunção de comunhão, invocando que o logradouro está há muito exclusivamente afecto ao uso exclusivo de algum ou alguns dos condóminos, isto por interpretação “a contrario sensu” do artigo 1421.º, n.º 2, alínea e), do citado Código Civil.
LOGRADOUROS - PARTES COMUNS VS PARTES COMUNS DE USO EXCLUSIVO - ENCARGOS DE CONSERVAÇÃO E FRUIÇÃO
Existindo logradouros, considerados partes comuns, mas de uso exclusivo de alguns condóminos quem comparticipa nas despesas de conservação? Todos os condóminos proprietários ou somente os usufrutuários?
Há logradouros que, embora comuns, não são objecto de total comunhão!
Não existindo comunhão ou sendo ela só parcial... O direito de PROPRIEDADE pode ser COMUM, o de GOZO pode ser EXCLUSIVO....
A propriedade horizontal pressupõe a divisão de um edifício através de planos ou secções horizontais ou através de um ou mais planos verticais [nem sempre a divisão na vertical é subsumível ao instituto da propriedade horizontal], que dividam o prédio em unidades autónomas num edifício dotado de estrutura unitária.
Assim, podemos estar perante uma estrutura unitária relativa a diversos blocos/condomínios (conjunto de edifícios) - o que poderá originar especiais relações de interdependência entre os condóminos proprietários dos referidos blocos, designadamente no que respeita às partes comuns (cfr. art.º 1438.º-A, do Código Civil) - ou perante várias fracções autónomas ou corpos (blocos) autónomos/condomínios, com autonomia estrutural, independentes, com funcionalidade e autonomia, sem interdependência entre os diversos condóminos não sujeitos ao regime da propriedade horizontal entre si.
No caso supra descrito podemos estar perante uma situação de propriedades adjacentes ou contíguas (blocos), NÃO ligadas entre si pela existência de partes comuns afectadas ao uso de todas ou algumas unidades ou fracções que as compões, NÃO sujeitas ao instituto da propriedade horizontal entre si!
CÓDIGO CIVIL
Artigo 1424.º Encargos de conservação e fruição
(...)
3 - As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
4 - Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.
O artigo 1424.º, n.º 3, do Código Civil, fala em escadas ou partes comuns do prédio que sirvam EXCLUSIVAMENTE alguns dos condóminos, quer referir-se, ao mencionar estes, às respectivas fracções autónomas, atribuindo a responsabilidade das despesas aos titulares das fracções a que dão serventia EXCLUSIVA aqueles lances de escada ou partes comuns.
Apesar da diferença de redacção, o referido n.º 3 tem de entender-se dentro do mesmo espírito que ditou o n.º 4 do mesmo artigo 1424.º, apenas ficando isentos da responsabilidade pelos encargos de conservação e fruição, os condóminos cujas fracções de modo algum possam aproveitar da serventia dos lances de escada ou das partes comuns a que aquele n.º 3 se refere.
Havendo um USO NORMAL dos logradouros (terrenos não edificados que circundam o prédio, espaços imperativamente comuns afectos ao uso "exclusivo" de alguns condóminos (usufrutuários))...
Quem suportará os custos das obras de conservação e/ou reparação (v. g. impermeabilização contra infiltrações que, face, por exemplo, a deficiente escoamento de águas pluviais, até pode ser urgente e indispensável!)?
O(s) condómino(s) usufrutuário(s) do(s) referido(s) logradouro(s)?
O(s) condómino(s) usufrutuário(s) do(s) referido(s) logradouro(s) e os restantes condóminos proprietários?
Todos os condóminos?
E em que proporção?
É que, a demora na realização das obras de conservação e/ou reparação do logradouro pode causar prejuízos aos condóminos que possuem fracções autónomas adjacentes ao(s) referido(s) logradouro(s) originando os consequentes pedidos de indemnização!
SERÁ POSSÍVEL COMPRAR/VENDER O LOGRADOURO?
Ao contrário do que sucede na COMPROPRIEDADE, onde se reconhece a qualquer dos contitulares o direito de exigir a divisão da coisa comum (cfr. art.º 1412.º do Código Civil), prescreve-se na parte final do artigo 1423.º do Código Civil, para a PROPRIEDADE HORIZONTAL, a regra oposta.
CÓDIGO CIVIL
Livro III Direito das coisas
Título II Do direito de propriedade
Capítulo VI Propriedade horizontal
Secção III Direitos e encargos dos condóminos
Artigo 1423.º Direitos de preferência e de divisão
Os condóminos não gozam do direito de preferência na alienação de fracções nem do direito de pedir a divisão das partes comuns.
E o logradouro não é uma unidade predial, não é um prédio independente! Em minha opinião, o logradouro, terreno não edificado que circunda o prédio, é um espaço imperativamente comum, que cabe na previsão do disposto no artigo 1421.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil.
Outra possibilidade a equacionar...
O usufruto consiste no direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância. Com base nesta noção legal, alicerçada no artigo 1439.º do Código Civil, são muitos os casos em que se constituem usufrutos a favor de determinada (s) pessoa (s).
Será possível, ou não, declarar, por contrato (escritura pública, cfr. art.º 80.º do Código do Notariado), a venda do usufruto de um espaço do logradouro sito em determinado prédio urbano, por um preço convencionado, declarando o usufrutuário que o aceita?!
Na propriedade horizontal, cada condómino é PROPRIETÁRIO EXCLUSIVO DA FRACÇÃO AUTÓNOMA que Ihe pertence e COMPROPRIETÁRIO DAS PARTES COMUNS DO EDIFÍCIO (cfr. art.º 1420.º, n.º 1, do Código Civil).
O conjunto dos dois direitos - PROPRIEDADE EXCLUSIVA DA FRACÇÃO AUTÓNOMA e COMPROPRIEDADE DAS PARTES COMUNS DO EDIFÍCIO é incindível, indivisível ou inseparável; nenhum deles pode ser alienado ou transferido para outrem separadamente. (cfr. art.º 1420.º, n.º 2, do Código Civil).
Consistem em direitos reais independentes (propriedade e compropriedade). Ressalva-se a possibilidade de uma determinada fracção autónoma poder pertencer a vários titulares em regime de compropriedade.
Na propriedade horizontal, os condóminos não gozam do direito de pedir (exigir) a divisão das partes comuns do edifício. (cfr. art.º 1423.º, in fine, do Código Civil). Trata-se duma compropriedade forçada (cfr. art.º 1423.º, in fine, do Código Civil), diferente da compropriedade normal (cfr. art.º 1412.º, n.º 1, do Código Civil).
A denegação ou recusa do direito de exigir a divisão tanto se aplica às partes forçosa ou imperativamente comuns (cfr. art.º 1421.º, n.º 1, alíneas a) a d), do Código Civil), como às que são comuns por convenção das partes ou por mera presunção legal (cfr. art.º 1421.º, n.º 2, alíneas a) a e), e n.º 3, ambos do Código Civil).
Então, e se, na propriedade horizontal, os condóminos quiserem dividir ou adjudicar a coisa comum ou atribuí-la em domínio exclusivo a um, ou em compropriedade a alguns apenas dos condóminos?
E se determinado condómino pretender renunciar à coisa comum (não imperativa), perdendo ou abandonando voluntariamente qualquer direito que tenha sobre a coisa comum?
Será lícito um determinado condómino renunciar a qualquer direito que tenha sobre a coisa comum (não imperativamente comum), declarando transferir simultaneamente a responsabilidade pelas despesas necessárias à sua conservação ou fruição para um terceiro adquirente que manifeste vontade em aceitar assumir esse direito ou poder de uso e o concomitante dever de passar a responder pelas correspondentes despesas necessárias à sua conservação ou fruição?
Poderão ou não os condóminos acordar ou convencionar na divisão de um logradouro, quintal ou pátio comum?
Na propriedade horizontal, o processo de divisão ou adjudicação de partes não imperativamente comuns, carecerá sempre, ou não, de acordo de todos os condóminos, traduzido na modificação por unanimidade do título constitutivo da propriedade horizontal (escritura pública)?
É que, não podemos esquecer, o estatuto de um condomínio é definido pela lei e pelo respectivo título constitutivo da propriedade horizontal!